Reler Abril


Agora que a solução foi revelada, já posso dizer o que me fez levar este livro ao último almoço das quintas. Editado em 2009, «Alvorada Desfeita» passou (convenientemente) ao lado de quase toda a gente. Ou porque faz parte de um género pouco explorado em Portugal — a história alternativa — ou porque assenta na premissa do fracasso do 25 de Abril tal como o conhecemos, a verdade é que a edição não conheceu grande sucesso comercial. O que é pena, porque é um livro extraordinário pelas reflexões a que conduz.

Quase quarenta anos após o golpe que pôs fim ao Estado Novo, já é tempo de submeter a data a uma análise objectiva deixando de lado paixões e sacralizações. Tal como o livro descreve, as coisas podiam ter corrido de forma bem diferente. Se é verdade que, em 1974, Portugal estava numa situação de grande impasse, com um regime que precisava de mudanças decididas e decisivas, não é menos verdade que o 25 de Abril teve consequências catastróficas. Um golpe de estado que durante um par de anos transformou o país numa espécie de «manicómio em auto-gestão», colocando-o no limiar de um conflito armado; e que levou a uma «descolonização» que de exemplar só teve o nome, forçando milhares de portugueses a uma fuga precipitada das suas casas e abandonando milhões de outros a sangrentas guerras civis. Era difícil fazer pior, e só por ingenuidade ou egoísmo se pode continuar a festejar Abril. Nesse sentido, «Alvorada Desfeita» apresenta um retrato alternativo que, apesar de ficcional, abre interessantes discussões. Afinal, Portugal poderia ter sido tão diferente.

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